[Reportagens] Jennifer Lawrence na Vogue de setembro

A carreira de Jennifer Lawrence só tem crescido, como o D13 faz questão de frisar sempre que tem a oportunidade. A atriz é repleta de qualidades que a fazem única. Por isso, tem conquistado um espaço bem confortável entre as mídias. E, pela primeira vez em sua carreira, ela é agora capa da edição de setembro da Vogue norte-americana.

A partir da reportagem postada na íntegra no site da Vogue, o D13 traduziu todas as sete páginas de entrevista. Além disso, adicionamos à nossa galeria as imagens do ensaio fotográfico realizado pela revista. Confira todas as imagens divulgadas neste link.

Sem mais adiar, confira a reportagem traduzida:

Jennifer Lawrence, de Jogos Vorazes, é a capa da edição de setembro

Seja iluminando um filme independente ou liderando uma franquia sucesso de bilheteria, Jennifer Lawrence é o talento mais elétrico a atingir Hollywood nessa geração. Jonathan Van Meter encontrou a heroína favorita da América.

Deixe J. Law escolher o Odeon, um restaurante que ela escolheu de uma lista porque gostou do som do nome. Ele foi aberto em uma esquina em Tribeca muito antes de Lawrence nascer e definiu um gênero: execute tudo perfeitamente, mas não leve tão a sério – uma apta descrição da própria Lawrence. De fato, o Odeon tem durado 30 anos porque, enquanto se importa com ótimo serviço e boa comida, ele está comprometido acima de tudo a ser divertido. Na verdade, eu mesmo me diverti tanto lá no início dos anos 90 que quando entrei às 13h de uma sexta-feira e me sentei, tive uma reação que só pode ser descrita como pavloviana: pedi uma vodca.

Jennifer Lawrence – diferentemente de, digamos, Jennifer Aniston ou Jennifer Lopez ou Jennifer Garner – nunca parece a mesma. É um dos motivos pelos quais os escritores tem dificuldade em encontrar palavras para descrevê-la e frequentemente recorrem a algumas infelizes, como camaleão. David O. Russell, o homem que dirigiu Lawrence rumo a um Oscar em O Lado Bom da Vida, lembra-se de tê-la encontrado durante a temporada de premiações em 2011. “Eu via essa loira alta nos eventos e nunca entendia quem ela era,” ele diz. “Ela parecia uma garota de Orange County – ou uma Barbie Malibu. E eu pensava, ‘Quem é ela?’ E alguém dizia, ‘É a Jennifer Lawrence,’ e eu dizia, ‘A garota que cozinha um esquilo com um graveto em Inverno da Alma?’ Eu nunca a reconheceria! Ela está sempre diferente.”

Tão diferente que, na verdade, mesmo depois de um dos seus dois guarda-costas entrar no restaurante para me dizer que ela estava chegando, quando ela finalmente passou pela porta, eu ainda não a reconheci. Para ser sincero, ela estava com óculos bem pretos de Tom Ford e de cabelo molhado; ela recentemente fez um corte Karlie, que é metade loiro e metade castanho. (“Muito gambá?” ela me pergunta mais tarde. “Acho que preciso fazer uma decisão.”) Mas antes de ela chegar à mesa, ouço aquela voz grossa – o ronco grave de tanta energia nervosa. É, é ela.

Lawrence, que está usando uma blusa sem mangas rosada (comprada uma hora atrás na Topshop), calças pretas folgadas e chinelos, percebe imediatamente que estou com um gesso no pé e um coquetel na minha frente. Depois de rapidamente explicar como o quebrei (festa de aniversário de cinquenta anos, pista de dança, 3 da manhã), ela fixa seus olhos azuis-cinzentos em mim com um rosto adoravelmente solidário, claro, mas também contorcido por tentar segurar uma risada. Meu pé é o motivo pelo qual todas as coisas ao ar livre que faríamos – andar a cavalo, andar pelo Central Park – terem sido canceladas. Minha sugestão de ir a um fliperama em West Village jogar sinuca ou vídeo-games foi rejeitada porque, diz Lawrence, “É exatamente o meu demográfico.” Então aqui estamos nós. “Devíamos ficar bêbados?” ela pergunta enquanto o garçom deixa uma cerveja à sua frente. Talvez seja o espectro do passado do Odeon – um lugar famoso pelo livro de Jay McInerney sobre os excessos dos anos 80, Bright Lights, Big City (do qual ela nunca ouviu falar) – que nos lança a uma farra de sete horas. Em todo caso, poderia ser pior cair em tal decadência.

Você pode saber muito sobre uma pessoa em sete horas. Coisas pequenas, como os tipos de comida que ela não gosta –  rúcula, berinjela, queijo de cabra (“Tenho o paladar de uma criança de cinco anos”), por qual programa de TV ela é obcecada (Homeland), as coisas estranhas das quais elas tem medo (“Não tenho pesadelos com palhaços, ladrões ou assassinos. Tenho pesadelos com pessoas de 13 anos. Eles me apavoram”). Mas você também pode saber coisas superespecíficas. Por exemplo, ela ganhou o apelido J.Law na sétima série, mas foi só nessa primavera que ela conheceu J.Lo enquanto passava o tempo em uma festa numa noite qualquer com Jimmy Fallon. “Nós planejamos tudo, íamos girando até ela e diríamos, ‘Por favor, dance com a gente!’ Mas no último minuto, Jimmy desistiu e de repente eu saí girando sozinha e disse, ‘Dance com…comigo?’ E ela, ‘Obrigada, vou só assistir.’”

E aí está a maior surpresa sobre Jennifer Lawrence: ela tem uma alma de comediante e improvisa sobre praticamente qualquer coisa que passar em seu caminho. Ela fez um monólogo de 20 minutos sobre esponjas: “Eu acordo mais cedo de manhã quando tenho esponjas novas. O balcão mal sabe o que o aguarda.” Ela continuou com sua incompreensão de pessoas que não compartilham de sua “fé em esponjas” e finalmente chegou a seu relacionamento com o ex-namorado Nicholas Hoult, de quem ela ainda é muito próxima (eles estão filmando X-Men: Dias de um Futuro Esquecido juntos). “Ele nunca as torcia. Estávamos uma vez na cozinha, eu peguei a esponja e ela estava ensaboada e molhada, e eu disse, ‘Viu? Esse é o tipo de coisa que me faz pensar que nós nunca vamos dar certo.”

O pessoal que a conhece melhor (ou seja, outros atores e diretores, já que ela tem vivido de um set de filmagens para outro por maior parte de sua vida adulta) sempre aponta para esse lado brincalhão de Lawrence – essa “bola gigante de bobeiras”, como alguém disse – como a coisa mais importante sobre ela. Seu colega de elenco de Jogos Vorazes Woody Harrelson diz que ela cria uma atmosfera no set de brincadeira constante. “Ela é única, cara. Ela é ela mesma. Adoro como ela não se censura. Ela diz as coisas mais absurdas. Simplesmente incríveis, as coisas que ela diz.”

Como diz Russell, “Ela cresceu com dois irmãos mais velhos, então ela faz uma piada vulgar que te choca e te faz rir muito. E aí ela simplesmente segue em frente.” Jodie Foster, que a dirigiu em Um Novo Despertar alguns anos atrás, concorda: “É uma das coisas que eu mais gosto nela – seu cérebro veloz com humor de um garoto adolescente.”

Momentos depois de Lawrence entrar no restaurante e se sentar, ela tira os sapatos para me mostrar seus dedos. Eles estão azuis. Ela tem estado em Montreal durante todo o verão, gravando o quinto X-Men, no qual ela interpreta a supervilã Mística, uma garota sexy de pele azul e olhos amarelos que se transforma em pessoas normais para assassinar os envolvidos em atividades antimutantes (aí está o demográfico do fliperama). “Eles me pintam de azul todos os dias,” ela diz, “então é com isso que estou lidando.” Ela mostra seu pé de novo e ri. “Sou como um cisne azul.”

Como se uma franquia de um estúdio grande não fosse o suficiente, no ano passado, Lawrence passou vários meses em Atlanta e no Havaí gravando o segundo filme de Jogos VorazesEm Chamas, previsto para novembro, depois do qual ela foi diretamente para o set de American Hustle, o próximo filme de David O. Russell (previsto para dezembro), inspirado na operação do FBI do fim dos anos 70 conhecida como Abscam, um escândalo de propinas quase cômico que derrubou um senador dos EUA e seis deputados. O novo grupo de Russell reúne Lawrence com seus colegas de elenco de O Lado Bom da Vida Robert de Niro e Bradley Cooper, e a atriz, como favor a Russell, encaixou esse filme entre as gravações de duas das séries de maior bilheteria em andamento, o que te dá uma noção de quão encantada – e itinerante – se tornou a vida de Lawrence.

O lado negativo é que mais de uma pessoa com quem conversei sobre Lawrence disse em alta voz que se preocupa que ela esteja trabalhando demais. “Só pela sanidade dela, eu pessoalmente gostaria que ela desacelerasse um pouco,” diz Francis Lawrence (sem parentesco), que dirigiu Em Chamas e em outubro começará as gravações dos dois últimos Jogos Vorazes em Atlanta simultaneamente. “Acho que ir de um set para o outro eventualmente terá um preço. Espero que em algum momento ela tire uma folga.”

Lawrence deveria ter tirado uma folga entre Em Chamas e X-Men, mas durante sua volta olímpica por ter ganhado o Oscar por O Lado Bom da Vida, Russell a pediu para interpretar a esposa de Christian Bale em American Hustle – e aí escreveu o papel de Rosalyn expressamente para ela. “Rosalyn é 100% um produto da imaginação de David,” ela diz. “Ela é uma alcoólatra maníaco-depressiva, e eu mal podia esperar. Além disso, pude beijar Christian Bale.”

Russell mal contém sua felicidade com a maneira como sua musa abraçou completamente seu primeiro papel realmente adulto – incluindo um casaco de pele grande demais, óculos de sol roxo-esfumaçados e um penteado cheio de laquê. “É uma personagem meio desvairada, intensa, manipuladora, brilhante, mas também cheia de alma e uma dona-de-casa de Long Island de partir o coração. E isso foi empolgante para ela. Ela tem uma alegria genuína, que está no seu sangue, de interpretar outras pessoas.”

Mais do que qualquer outra atriz jovem na memória recente, Lawrence também parece ter uma necessidade quase compulsiva de aproveitar todas as oportunidades que aparecem em seu caminho. “Eu não podia dizer não,” ela diz. “E aí quando eu estava no set, eu pensava, ‘Isso é tão mais importante do que férias. É tão melhor para o meu cérebro estar estimulada criativamente desse jeito.’ Isso me lembrava: é isso que eu amo.”

Uma das esquisitices da vida de Jennifer Lawrence agora é que a personagem com a qual ela está mais associada – Katniss Everdeen, de Jogos Vorazes – está em uma trajetória que é, de várias formas, semelhante à da própria Lawrence. “Quando Inverno da Alma foi indicado,” diz Lawrence, “eu só tinha feito filmes independentes, e de repente estava sendo apresentada a esse mundo totalmente novo onde eu não me sentia como eu mesma. Eu estava usando roupas estranhas e ouvindo pessoas falarem sobre coisas que eu não entendia. E eu me lembro de ter lido isso no livro e pensado, ‘Meu Deus, eu sei exatamente qual é essa sensação.’ Não sei como é se preparar para sua morte, mas sei como é ser quase uma marionete. E aí quando eu estava fazendo o segundo filme, eu conhecia mais esse mundo, e acho que isso é algo que Katniss vive. Ela é diferente quando volta. Ela se sente mais confortável na Capital; ela entende mais as pessoas, e não é tão sinistro e assustador e não-familiar. Ela meio que sabe como trabalhar com o sistema.”

Francis Lawrence, que substituiu o diretor do primeiro Jogos Vorazes, Gary Ross, por motivos em sua maioria relacionados a agenda, é um diretor conhecido por seus clipes musicais estilosos para Lady Gaga, Pink, e Missy Elliott, assim como o filme de Will Smith Eu Sou A Lenda. Como a segunda parte explora mais profundamente a extravagância visual absurda da Capital, uma das maiores mudanças que o diretor fez foi trazer a figurinista Trish Summerville, com quem ele trabalhou em clipes musicais e que fez os figurinos de Os Homens Que Não Amavam As Mulheres. “Eu achei que haviam oportunidades maravilhosas para alguns momentos ótimos de moda no filme,” ele diz. O grande golpe de Summerville foi conseguir que Sarah Burton de Alexander McQueen emprestasse várias peças de arquivo e de passarela, em sua maioria usadas pela mestra de cerimônias, Effie Trinket, corajosamente interpretada por Elizabeth Banks, parecendo a tia louca de Gaga. “No primeiro filme,” diz Summerville, “parecia que todo mundo comprava na mesma loja. Eu queria mostrar variedade. A elite, mas de todos os caminhos da vida. Então fiz tendências de moda: chapéus de feltro moldados são tudo! Xadrez está em alta! Esse tipo de coisa.”

É interessante que Summerville tenha vestido Katniss Everdeen e Lisbeth Salander, de Os Homens Que Não Amavam As Mulheres. Ambas são personagens complicadas – garotas duronas que se viram e possuem uma força interna estranha que elas mesmas não entendem completamente. E ambas representam um novo tipo de heroína de Hollywood. “As mulheres nunca foram realmente mostradas desse jeito, como o jovem herói,” diz Jodie Foster. “É uma longa tradição – essa estrutura tem milhares de anos – e acho que quando vemos mulheres como essas personagens, vemos uma pessoa real, um caminho heróico verdadeiro.”

As atrizes interpretando essas personagens também tem qualidades semelhantes. Ambas Jennifer Lawrence e Rooney Mara são peculiares, não-convencionais e imensamente talentosas, jovens estrelas brilhantes indicadas ao Oscar logo de cara. E elas duas também tem uma seriedade quieta. Elas parecem sereias independentes que poderiam ter carreiras perfeitamente satisfatórias fazendo filmes menores mais idiossincráticos. E ainda assim, aqui estão elas, carregando essas franquias gigantes.

“Eu as vi trabalhando muito,” diz Summerville, “as longas horas, as condições, quão atléticas elas têm que ser, a disposição. É preciso muito talento, e ambas têm isso. E elas são realmente espertas, inteligentes e rápidas.” Essa velocidade se traduz para a tela: as duas tem um aspecto mutante que é quase Streep-iano. Como diz Summerville, “Não acho que haja um papel que elas não possam interpretar – elas podem ser de época, podem ser contemporâneas, podem ser futuristas. São rostos eternos. Não dá para arquivá-los.”

Talvez duas pessoas não façam uma moda, mas se estamos no começo de uma era nova e menos conservadora em Hollywood, já  era hora. “Estamos saindo da brandura estilo CW e entrando nessas performances cruas, interessantes e cheias de nuances,” diz Francis Lawrence. “Mas uma coisa com a qual me preocupo é a superexposição. Muito poder vem do anonimato delas, e eu espero que essas duas jovens atrizes possam manter um pouco da sua privacidade.”

Não será fácil. David O. Russell viu a fama de Lawrence se materializar diante de seus próprios olhos. “Quando ela apareceu pela primeira vez no set de O Lado Bom, ela estava perguntando a Bradley Cooper e Robert De Niro como era ter pessoas te abordando na rua,” ele diz. “Isso não acontecia com ela. As pessoas não sabiam realmente quem ela era. Mas quando o filme foi lançado e fizemos um evento em Santa Barbara, era como estar em um show dos Beatles. Havia milhares de pessoas gritando. Foi impressionante.”

Eu admito que me incomodei inicialmente com a presença dos guarda-costas de Lawrence, os quais podemos ver do lado de fora do Odeon, encostados em um grande SUV preto. Eu não tinha internalizado completamente que a pessoa completamente sincera sentada à minha frente – a mesma jovem garota bravia e divertida que eu tinha visto na TV, sendo insolente com entrevistadores e flertando com Jack Nickolson no Oscar enquanto era entrevistada por George Stephanopoulos depois de ter tropeçado na saia volumosa de seu vestido Dior enquanto subia as escadas para receber sua estatueta – que aquela garota é exatamente a mesma garota que agora é perseguida por paparazzi onde quer que vá porque ela é nova e bonita e imprevisível e foi batizada como a estrela de cinema mais empolgante e completamente realizada que apareceu em décadas.

Aparentemente, ela também não internalizou isso completamente. Sempre que a tênue bolha de privacidade que ela criou ao nosso redor – por meio de linguagem corporal, encarando o lado de fora do salão – é invadida, ela fica agitada. Em certo momento, um grupo de quatro pessoas se senta perto de nós e uma mulher que poderia ter sido considerada sofisticada na mesa vê Lawrence, pega seu telefone e o aponta e começa a clicar, como se documentasse sua visita ao Louvre. “Você pode parar?” pede Lawrence. Com a cabeça baixa, ela resmunga pra mim. É, foi bem agressivo, eu digo. “Eu?” ela diz, mortificada. Não, ela, eu digo. “Estou realmente começando a me sentir como um macaco no zoológico,” ela admite.

Lawrence está bem ciente que ninguém gosta de ouvir pessoas famosas reclamarem da fama. (E sem dúvida sua publicista lhe disse que essa é uma afirmação ruim.) Mas é um assunto – “um tópico perigoso,” ela diz – para o qual voltamos várias vezes porque ela obviamente está tendo dificuldades para se ajustar. “Eu pareço quase ingrata quando falo sobre isso,” ela diz em um momento, “mas vou ter um colapso sobre isso depois.” Entretanto, não surpreende que ela até se dê bem para uma novata que, sejamos sinceros, provavelmente não imaginava isso. “De repente o mundo inteiro acha que deve saber tudo de mim, incluindo o que eu estou fazendo nos fins de semana quando passo tempo com o meu sobrinho. E não tenho o direito de dizer, ‘Estou com a minha família.’”

Não é segredo que a Internet criou uma realidade nova e mais infernal para os atores, parcialmente porque agora todos são paparazzi – como por exemplo a mulher sentada perto de nós. Antes de tocarem os violinos, Lawrence tem sim um ponto: “Se eu fosse uma garota normal de 23 anos,” ela diz, “e ligasse para a polícia para dizer que haviam homens estranhos dormindo no meu jardim e me seguindo até a Starbucks, eles entrariam logo em ação. Mas como eu sou uma pessoa famosa, bem, sinto muito, senhora, não podemos fazer nada. Não faz sentido algum.” O que realmente a incomoda é quando as pessoas dizem, “Você tem que fazer as pazes com isso.” “Não estou OK com isso,” ela diz. “Simples assim. Sou só uma garota normal e um ser humano, e não estou nisso há tempo suficiente para sentir que esse é o meu novo normal. Não vou encontrar paz nisso.”

Ouvindo Lawrence ficar agitada com isso, não pude deixar de pensar: ela vai encontrar uma causa pela qual lutar um dia, e não serão os direitos das celebridades e os paparazzi. Isso só  é a injustiça que ela está vivendo agora. Ela vai se acostumar com ser famosa, ou as coisas vão se acalmar, mas é mais do que claro que há uma ativista feminista escondida em algum lugar dentro dela. Eu não ficaria nem um pouco surpreso em vê-la um dia marchando em Washington de mãos dadas com Susan Sarandon e Sean Penn.

Russell também acha que isso deve passar. “Ela adora viver e ter sua liberdade. Tenho certeza de que ela encontrará  um jeito de continuar fazendo isso.” Jodie Foster, que sabe uma coisa ou outra sobre ter sua vida abalada pelas obsessões de outras pessoas, diz isso: “Não era o mesmo quando eu era jovem. Eu nunca contratei um guarda-costas na vida. Mas certamente há uma maneira de viver sua vida – sua vida real, a que você vive depois das 17:00 – e não precisa ser assim. É uma coisa temporária. Ela tem os pés no chão e é sólida, com pais ótimos e tudo o mais; eles a lembrarão de quem ela é. Acho que ela tem a habilidade genética dada por Deus de ser bem ajustada.”

Quando eu digo a Lawrence que faz tempo que não faço o perfil de uma atriz, ela me olha. “Oh, não,” ela diz, “Você  está enferrujado?” Não consigo deixar de imaginar de onde vem todo esse lado cômico. Seus pais, Karen e Gary, criaram ela e seus irmãos mais velhos, Blaine e Ben, em Louisville. Eles eram engraçados? “Minha mãe é muito divertida,” ela diz. “Ela é engraçada e barulhenta. E meu pai é o contrário – a pessoa mais engraçada que você vai conhecer, mas ele nunca levanta a voz. Ele é simplesmente muito rápido. Muito sutil.” Ela pausa. “Nós definitivamente crescemos com diversão.” Outra pausa. “Você precisa ser engraçado na nossa família, para sobreviver, porque somos muito cruéis uns com os outros.”

Apesar de ela fazer piada com isso (“Eu acho que todas as mães são pesadelos – não acho que dê para ter filhos e não perder a cabeça”), ela é próxima de seus pais. Sua mãe possui um acampamento de verão (Blaine o dirige agora), e seu pai estava na construção. (Ben é webdesigner.) A história de como a filha deles foi descoberta – fotografada na Union Square em Nova York por um olheiro de modelos quando ela estava visitando a cidade no recesso de primavera aos 14 anos – já foi tão escrita que, apesar de ela só ter 23 anos, já se tornou um mito. Seria verdade? Alguém tão obviamente talentosa nunca havia pensado em atuar? “Olha,” ela diz, “eu cresci em Kentucky, tenho irmãos, nós tínhamos que fazer esportes, eu era uma péssima aluna e vivia ficando de castigo quando chegava o meu boletim. Atuar nunca foi uma opção. Não era como, ‘Oh, bem, você tirou 5 em matemática; está de castigo. Mas pode ser atriz!’”

Durante todo o nosso almoço no Odeon, a parte de Lawrence que nunca desapareceu foi um comprometimento intenso com o mundo ou com a pessoa em frente a ela. Você podia praticamente ver seu cérebro escaneando o salão, analisando as informações, e aí liberando algo secamente observado, no momento certo, ou estranhamente profundo. (Em um momento, ela pegou meu gravador RadioShack e o examinou: “Isso é arcaico. Você vai escrever tudo isso à mão, tipo, com uma caneta?”) Se há um lado ruim – e eu não o considerei como tal – pode ser que ela está tão ocupada conectando e processando que é demais pra ela. Houve vários momentos nos quais ela estava tão empolgada para compartilhar as sete coisas que tinham aparecido em sua cabeça que isso a deixava sem ar e momentaneamente incompreensível. Como Jodie Foster diz sobre dirigi-la, “É difícil para ela ser superficial, menininha, boba e ignorante. Então minha direção era frequentemente com coisas estúpidas, como ‘Mexa muito suas mãos’ ou ‘Ria’, só tentando soltá-la para que ela não estivesse tão ciente de sua própria significância.”

Dada a sua intensidade, não é surpresa que Lawrence descreva sua infância como “infeliz” – crianças excepcionais, empolgadas, muito ligadas são frequentemente mal-compreendidas e cheias de ansiedade. A própria Lawrence era tão ansiosa que seus pais lhe conseguiram um terapeuta. “Eu era uma esquisita,” ela diz. “Não zombavam de mim nem coisa assim. E eu não era mais esperta do que as outras crianças; não era por isso que não me encaixava. Eu sempre tive essa ansiedade estranha. Eu odiava o recreio. Não gostava de passeios com a turma. Festas realmente me estressavam. E,” ela acrescenta, “eu tinha um senso de humor bem diferente.” Pergunto a Lawrence como isso se manifestava, digamos, no fim do ensino fundamental. Ela solta várias histórias como exemplos. Como a vez em que ela decidiu que seria divertido saltar pela saída de emergência de um ônibus escolar em movimento; ou quando ela achou que seria muito engraçado anunciar para toda a sétima série que ela tinha molhado a cama; ou isso, “Minha família fez um cruzeiro e fiz um péssimo corte de cabelo. Para a sua informação: nunca corte o cabelo em um cruzeiro. E eu tinha, tipo, um afro loiro, e entrei na academia no primeiro dia de volta da sétima série e todos estavam me encarando, e por algum motivo eu pensei, eu sei o que tenho que fazer! E comecei a correr de uma ponta à outra da academia, e achei hilário. Mas ninguém naquela idade achava. Era genuinamente esquisito.”

David O. Russell menciona uma história que Lawrence o contou sobre como quando ela tinha dez anos, tocava sua própria campainha e fingia ser outra pessoa quando a família atendia: “Oi, meu nome é Susan. Meu carro quebrou aqui na rua e eu queria saber se posso entrar e usar seu telefone.” Com tudo isso, é difícil acreditar que Lawrence – ou seus pais – não suspeitava que ela estava destinada ao show business. “Eu nunca disse isso antes,” ela diz, “porque não há como dizer sem ser totalmente mal-compreendida, mas desde que eu era bem pequena, eu sempre tive uma ideia bem normal do que eu queria: eu seria uma mãe e uma médica e viveria no Kentucky. Mas eu sempre soube” – aqui ela abaixa a voz – “que seria famosa. Juro por Deus que não sei outra forma de descrever. Eu costumava ficar na cama pensando, Vou ser uma pessoa da TV local? Vou dar palestras motivacionais? Não era uma visão. Mas como está acontecendo, você tem essa compreensão: é claro.”

Lawrence deixou a escola quando tinha quinze anos para seguir a carreira de atriz, e em 2006, ela estava vivendo em um condomínio em Santa Monica com sua mãe. Ela rapidamente foi escalada na comédia da TBS The Bill Engvall Show, que durou apenas três temporadas. “Eu sei que parece muito idiota,” diz Lawrence, “mas era como se eu finalmente tivesse encontrado algo em que as pessoas diziam que eu era boa, o que eu nunca, nunca tinha ouvido. E esse era um grande motivo para meus pais me deixarem fazer isso. Uma vez, minha mãe estava no telefone com meu pai, dizendo, ‘Estamos pagando terapia e todos aqueles remédios, e não precisamos quando ela está aqui. Ela está feliz.’”

Lawrence fez uma série de filmes independentes, incluindo a estreia na direção de Guillermo Arriaga, Vidas Que Se Cruzam, com Charlize Theron. E aí, pouco antes de ela fazer 19 anos, ela gravou Inverno da Alma, o filme de baixo orçamento profundamente comovente sobre uma família de viciados em metanfetamina nos Ozarks, dirigido por Debra Granik – e conseguiu sua primeira indicação. “Ela tem um talento tão puro,” diz Foster, que a escalou em Um Novo Despertar  baseado em alguns minutos que viu das filmagens de Inverno da Alma na sala de edição. “Ela tem um talento realmente quieto que acho que no início, nem ela entendia que tinha.”

“O que quer que tenha acontecido com ela quando era nova, quando ela deu um jeito nas coisas,” diz Russell, “ela transmutou toda essa energia para a alma e a liberdade que ela coloca na atuação.” Durante as filmagens de Em Chamas, Francis Lawrence ficou “maravilhado com o aparente pouco trabalho que ela tem com uma performance e como tudo parece tão instintivo,” ele diz. “É tudo espontâneo; sai de dentro dela, no momento. Nunca vi nada parecido.”

Russell ficava constantemente surpreso com sua suposta indiferença. “Eu me lembro de Bradley Cooper e eu dizendo, ‘Essa garota está ao menos prestando atenção?’ Porque ela ficava brincando ou comendo minhas batatas fritas ou fazendo piadas de peido. E aí do nada, ela entra, e bam!Ela é como muitos grandes atletas. Você vê que eles ficam relaxados, e é assim que eles conseguem estar tão concentrados sob uma pressão enorme. Se há dois minutos restantes no jogo, eles podem entrar e fazer algo extraordinário porque não estão tensos. Jen fica relaxada. E aí ela faz uma cesta de três pontos de uma distância absurda e nós só olhamos um pro outro e dizemos, ‘Uau.’”

Depois de quatro horas no Odeon, juntamos nossas coisas (“Não esqueça seu telefone de carro dos anos 90,” ela diz) e saímos. Entramos no SUV e imediatamente pegamos um engarrafamento (“Tem trânsito demais,” ela diz para o motorista. “Você está demitido”). Estamos voltando para o Hotel Greenwich (que é do amigo de Lawrence, De Niro, quem ela encontrou por acaso noite passada), onde ela está durante o fim de semana, em uma suíte enorme no sexto andar. Ficamos nas grandes janelas enquanto uma tempestade de verão surge e encharca todas as pobres pessoas na rua abaixo. “Agora eu sou uma grande fã de janelas,” ela diz. “Fico parada na minha janela do hotel de Montreal. Pode ser por horas. É o único momento onde posso observar grandes grupos de pessoas e elas não estão olhando pra mim.”

De repente, sua assistente e melhor amiga de quatro anos, Justine, entra. Ela acaba de voltar do almoço com um ex-namorado, e elas analisam o significado de cada frase. Aí Lawrence dá uma conferida na amiga e diz, “P.S.: Roupa perfeita. E sua bunda fica ótima nessa saia.” Elas se conheceram quatro anos atrás, pouco depois das filmagens de Inverno da Alma, em Los Angeles, e foi amor à primeira vista. No Odeon, quando eu perguntei a Lawrence como ela se mantém sã enquanto trabalha tanto, ela disse, “Justine está comigo. Então é essa coisa consistente na minha vida. Ainda faço o que uma garota de 23 anos deveria estar fazendo, que é passar tempo com uma amiga e sendo normal. Ainda tenho que tirar a louça da mesa. E ainda tenho que ouvir. Quando você faz divulgação por muito tempo, você fala sobre si mesma constantemente. O meu maior medo é levar isso para o mundo real.”

Justine diz, “Sobre o que vocês conversaram em quatro horas?” Eu menciono que uma das coisas que discutimos foi o quão estranho é a imprensa ligar tanto para o fato de sua amiga ser tão “animadoramente sem filtro”, só por ela ter opiniões e ser engraçada.

“Eu só acho que quando você é famoso, tudo é exagerado,” diz Justine. “É porque ela é honesta. Parece um pouco brega, mas ela tem o corpo de uma pessoa real, ela xinga e diz as coisas erradas na televisão, e ela é simplesmente ela mesma. Literalmente todos os outros estão jogando o jogo, mas ela não. E não acho que ela seja capaz de jogar, sinceramente.” Ela continua, “A pergunta que eu mais ouço é, ‘Ela mudou?’ E sinto muito prazer em poder responder, ‘Não. E se mudou, foi para ficar com os pés mais no chão, mais normal.’”

Talvez não seja acidente que a atriz Lawrence fique mais “admirada” com seu colega de elenco de X-Men James McAvoy, “porque ele sabe o que é importante: ele tem uma esposa, um bebê, e uma tranquilidade que vem só de saber que essa é a razão da vida.” Lawrence parece determinada a manter um senso de si mesma também, apesar da loucura de Holywood, onde as pessoas regularmente dizem que ela devia namorar alguém “do nível dela”. “Tipo, que nível é esse?” ela pergunta. “Isso não significa nada pra mim, como pessoa.”

Lawrence parece muito ciente de que ela é uma garota do Kentucky com um talento fantástico que por acaso está  em uma onde enorme. Em um certo momento no Odeon, eu a perguntei se ela estava gostando de Montreal. “Um pouco. Quer dizer… uh… sim? Sim e não. É só que ainda estou me acostumando às coisas. Ainda fico um pouco emotiva vendo a velocidade com que tudo muda… que muda tão rápido. Então tenho ficado muito em casa ultimamente. Mas acho que eventualmente, um dia desses, acho que quando a próxima grande franquia começar e eu não estiver nela, e nascer a nova Jennifer Lawrence, aí eu poderei sair.”

Por enquanto, ela não tem nenhum plano de desacelerar tão cedo. Um dos projetos com o qual ela está mais empolgada, ela diz, é produzir a versão cinematográfica do livro de memórias de Jeannette Walls O Castelo de Vidro. Quando eu menciono que sempre pensei em Walls como uma regressão aos anos 40, com seu cabelo vermelho alto e sorriso grande e cheio de dentes, ela diz, “Sim, essas são as coisas que estou tentando tirar do filme.” Peço que ela explique, e acontece que Lawrence levará um pouco de sua própria autenticidade bravia para o papel. “Jeannette queria se encaixar em um mundo elegante, então ela tomava banho o tempo todo porque nunca se sentia limpa,” diz Lawrence. “Eu acho isso, ver alguém por duas horas, você quer que ela tenha alguma sujeira, que seja um pouco brega, sabe? Acho que gostamos mais dessas pessoas.”

Jodie Foster, a garota adorável original com sujeira debaixo das unhas que passou sem esforço do cinema artístico dos anos 70 para os sucessos de bilheteria dos estúdios – sem mencionar que praticamente escreveu o livro sobre como ser perigosamente famosa e teimosamente privada – entende esses tipos de dicotomias: “Como eu, ela não tem medo do seu lado sério. Mas ela também é  divertida e cheia de vida, e de certa forma, essa é a parte que vai salvá-la. Ela ter os dois lados. Ela pode ver o lado trágico e o lado cômico de sua vida.”


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5 respostas para “[Reportagens] Jennifer Lawrence na Vogue de setembro”

  1. Avatar de Emily
    Emily

    Simplismente uma diva, chega assim do nada e já conquistou mts coraçoes

  2. Avatar de Mateus
    Mateus

    Jennifer é uma mulher incrível, assim como a Merly Streep. Ela ainda tem futuro!

  3. Avatar de João
    João

    Jennifer Lawrence sempre linda e engraçada!! Realmente ela esta trabalhando muito, um filme atrás do outro, ela devia arrumar um tempo pra descansar…

    ps: Que é isso hein Distrito 13? Vocês traduziram um total de três capítulos de livro aqui… Agradecido pelo trabalho esforçado da equipe 😀

  4. Avatar de Mary
    Mary

    Vale dizer que a edição de setembro é a mais importante e prestigiada da revista Vogue em todo o ano, e sempre há uma grande expectativa a respeito de quem vai estrelar a capa. Isso diz muito sobre o prestígio da própria Jennifer no meio artístico. 🙂

  5. Avatar de Jax
    Jax

    Impossível não ler essa matéria e se apaixonar mais ainda com a Jen.