Distrito 13

CARTAS DO JARDIM DE ROSAS

Querido Gary Ross:

Poder. É disso que se trata? Sim? Poder e as forças que são manipuladas pelos homens poderosos e burocracias tentando manter controle e posse desse poder?

O poder perpetra a guerra e a opressão para manter-se até que ele finalmente tomba com seu peso burocrático e afunda nas páginas da história (exceto no Texas), deixando lições que precisam aprendidas desaprendendo.

O poder corrompe, a, em muitos casos, o poder absoluto te deixa muito excitado. Clinton, Chirac, Mao, Mitterrand.

Não é assim, eu acho, com Coriolanus Snow. Sua obsessão, sua paixão, é seu jardim de rosas. Há uma rosa chamada Sterling Silver que é lilás e tem uma fragrância extraordinariamente poderosa – incrivelmente bonita – eu a adorava nos anos 70 quando ela surgiu. Fizeram várias derivações dela desde então.

Eu não queria escrever para você até que tivesse lido a trilogia e agora li, então: rosas são muito importantes. E os olhos de Coriolanus. E seu sorriso. Esses três elementos são elementares e vibrantes em Snow. Todo o resto é, de longe, perfeitamente parado e violentamente contido. Nada, absolutamente nada o surpreende. Ele vê e entende tudo, ele era, muito provavelmente, um homem brilhante que sucumbiu à sirene musical do poder.

Como você dramatizará a narrativa interior na cabeça de Katniss que descreve e consistentemente atualiza ser relacionamento com o Presidente que é onipresente em sua mente? Com calma onisciente ele a conhece perfeitamente. Ela sabe disso e sabe que ele fará o que for necessário para manter seu poder porque ela sabe que ele acredita que ela é uma ameaça real ao seu frágil controle desse poder. Ela é mais perigosa que Joana D’Arc.

Seu diálogo/monólogo interno define Snow. É aquele velho pepino do teatro: você não pode ‘interpretar’ um rei, você precisa que todas as outras pessoas no palco digam umas às outras, e por consequência para o público, coisas como “Lá vai o Rei, ele é uma figura, tão mau, tão adorável, tão benevolente, tão cruel, como ele é brilhante!” A ideia dele, a definição dele, a percepção que o público tem dele, é primeiramente instilada pelas observações dos outros e quando essa ideia está pronta, a visão que o público tem do personagem é praticamente inflexível. E no caso de Snow, essa definição, é claro, vem de Katniss.

O mal parece ser nossa compreensão da história dos homens que estamos vendo. Não é o que vemos: é o que fomos levados a acreditar. Simples assim. Observe o rosto de Ted Bundy antes de saber o que ele fez e depois que você soube.

Snow não parece mau para as pessoas na Capital de Panem. Bundy não parecia mau para aquelas garotas. Minha esposa e eu estávamos dirigindo pelo Colorado quando ele fugiu da cadeia lá. O alerta no rádio do carro era constante. ‘Não dê carona a nenhum jovem. O fugitivo parece ser o jovem mais legal imaginável.’ A maldade de Snow aparece na forma da ameaça confiante complacente que está sempre presente em seus olhos. Sua tranqüilidade resoluta. Você viu um filme que fiz anos atrás? ‘O Buraco da Agulha’. Aquele cara tinha um pouco do que busco.

A mulher que vivia na mesma rua que nós em Brentwood veio perguntar à minha esposa quando ela estava deixando as crianças na escola. Essa mulher e seu marido tinham assistido o filme na noite anterior e o que ela queria saber era como minha esposa conseguia viver com alguém que podia interpretar um homem tão mau. Causou um ou dois jantares divertidos, mas ainda faz minha mulher pensar.

Eu adoraria falar com você quando puder para que estejamos pensando a mesma coisa.

Todos eles acabam do mesmo jeito. Bem-vindo à Flórida, tenha um bom dia!

Donald Sutherland